Estudos bíblicos
domingo, 19 de maio de 2019
Sem especulação
A maneira certa de estudar as profecias relacionadas com o fim
O senso de iminência e expectativa é bíblico, mas é preciso fundamentar a esperança na revelação da Palavra de Deus
Nascido do sonho de ver Jesus voltar nas nuvens, o adventismo tem a escatologia em seu DNA. Contudo, essa ênfase não significa especulação a respeito do fim nem marcação de datas, e sim uma firme esperança com base nas promessas do livro sagrado. Pelo menos deveria ser assim. Devido à sua centralidade para nossa fé, a escatologia, tema da matéria de capa desta edição, foi objeto de dezenas de estudos apresentados numa grande conferência realizada em junho na cidade de Roma. Dentro desse espírito, veja sete regras úteis para entender melhor a mensagem bíblica sobre o futuro
1. Preste atenção na intertextualidade. Os autores do Novo Testamento fizeram intenso uso das profecias do Antigo Testamento. Por exemplo, o Apocalipse é um mosaico de citações, alusões e ecos de Daniel, Ezequiel, Isaías, Zacarias e outros profetas. Por isso, tente descobrir de onde vêm as ideias, as imagens e os símbolos do livro.
2. Examine o tipo de profecia. Como regra, as profecias clássicas são condicionais e locais, enquanto as profecias apocalípticas são incondicionais e universais. Se o foco dos profetas clássicos (como Isaías e Jeremias) era a transformação da realidade de sua época, a ênfase dos profetas apocalípticos (como Daniel e João) estava no cronograma divino para o mundo no tempo do fim.
3. Fique de olho na reinterpretação. Muitas promessas feitas a Israel são reinterpretadas no Novo Testamento e aplicadas ao povo de Deus reunido em torno do Messias. Em certos aspectos, o que era local passa a ser universal e o que era literal se torna espiritual. Essa universalização inclui o próprio conceito de Israel e da “terra” como herança do povo de Deus.
4. Mantenha o foco no fator central. Cristo é o centro de todas as profecias e a personificação do reino de Deus. Por isso, analise de que maneira o conteúdo da profecia se relaciona com a vida e o ministério Dele.
5. Considere o presente e o futuro. O Novo Testamento apresenta o reino de Deus em dois estágios (já e ainda não). O reino já foi inaugurado com a primeira vinda de Jesus, mas a consumação dele está no futuro, com a segunda vinda. É importante manter esse equilíbrio.
6. Evite a “atomização”. As profecias relacionadas com o fim do mundo não estão desconectadas da história da salvação. Portanto, considere o plano completo de Deus para a humanidade. A volta de Jesus não acontecerá num vácuo; ela está ligada a tudo que ocorreu antes.
7. Tire o olhar do calendário. Muitos grupos tentam marcar datas para a volta de Jesus e especulam quanto ao cumprimento dos últimos eventos, o que é um erro. Ao perceber os sinais, olhe para cima e aguarde Aquele que está voltando.
Sonhar com o fim e o novo começo faz parte da essência da nossa fé. O senso de iminência e expectativa é bíblico, mas é preciso fundamentar a esperança na revelação da Palavra de Deus. Embora muitos cristãos sejam movidos pelo sensacionalismo, escatologia de jornal pode ser pior do que ausência de escatologia. Por isso, escatologize da maneira correta.
MARCOS DE BENEDICTO é editor da Revista Adventista
(Editorial da edição de julho de 2018)
Fonte: http://www.revistaadventista.com.br/blog/2018/07/06/sem-especulacao/
O mal do século
Conheça dez passos que poderão ajudar você a lidar com a depressão
O número de pessoas com depressão aumentou assustadoramente nos últimos anos. Até algum tempo atrás, ela estava restrita às classes abastadas da sociedade, mas hoje afeta todas as camadas sociais, graças a vários fatores: democratização no acesso a alimentos processados e refinados, anteriormente “privilégio” dos ricos; dissolução do núcleo familiar, desestabilizando relacionamentos e gerando conflitos inter e intrapessoais; demandas e expectativas da vida moderna, em que estresse constante, competição desenfreada e consumo compulsivo causam uma gama de emoções difíceis de gerenciar.
Complexo e multifacetado como é o tema, não posso discutir aqui condutas terapêuticas ou correntes teóricas e filosóficas sobre o trato com a depressão, nem sua efetividade. Mas desejo mostrar o que você pode fazer por si mesmo:
1. Desenvolva espírito de gratidão. A mente é sensível à informação nova. Hábitos de pensamento adequados podem ser ensinados ao cérebro. Expressando gratidão, fruto de inevitável esforço para enxergar lados luminosos da vida, você inibe o principal combustível para a depressão: os pensamentos negativos. Não é apenas na física que dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço/tempo. Você não precisa sentir gratidão para racionalmente descobrir motivos para mostrar-se grato.
2. Perdoe. Todos. Inclusive você mesmo. O perdão não muda o que aconteceu. Porém, há um presente e um futuro a ser vividos. Mágoas, abusos, ofensas e decepções do passado devem permanecer lá. Vire a página. Como? Perdoando. Esse é o modo mais eficiente de seguir em frente. “Feche a conta” através do perdão, remova o fardo dos ombros e recomece de maneira leve um novo dia.
3. Respire profundamente. Se não sabe fazê-lo, aprenda. O oxigênio é excelente antidepressivo. É tão precioso que ninguém poderia pagar por ele e, assim, é de graça. Caminhe em um lugar que lhe dê prazer, que canse seus músculos, que distraia sua mente, que o “alimente” com belezas, harmonias e estímulos para viver.
4. Não tenha pena de si mesmo. Nada de autocompaixão. Não se vitimize. Você precisa de autoestima adequada. Atribua-se o valor que você tem. Para isso, é claro, conheça-se bem.
5. Não se leve tão a sério. Ria de seus eventuais erros, acertos e dificuldades. Eles perdem muito do peso se você olhar para eles com olhos bem-humorados. Encontre companheiros com quem possa fazer (e achar) graça.
6. Estabeleça metas realistas. Conquiste alvos e congratule-se pelas vitórias. Aprenda com os insucessos circunstanciais.
7. Evite o consumo de produtos nocivos ao equilíbrio mental. Entre eles estão cafeína, cereais processados, açúcar refinado e adoçantes artificiais. Eles fazem oscilar seu humor (em geral, para pior), pois desequilibram seus hormônios e o estoque dos nutrientes de que você mais precisa, especialmente vitaminas do complexo B.
8. Tenha um mentor ou conselheiro. Pode ser um amigo que ajude você sem causar dependência. Num grupo de apoio mútuo, focalize a palavra “mútuo”: seja bom ouvinte e ajude o outro. Os dois saem da escuridão, não importa quem esteja guiando.
9. Conte com ajuda profissional. Discuta todas as questões com seu médico ou psicólogo, inclusive este artigo. Ele pode sincronizar estas dicas com seu caso específico.
10. Não se esqueça de Deus. Embora nem sempre o entendamos, ele sempre nos entende. Ore, leia, medite, ouça sermões e música inspiradora. Além dos pensamentos, sentimentos e emoções, a mente possui um componente espiritual que busca a transcendência.
SILMAR CRISTO é médico, consultor e autor de vários livros sobre saúde e qualidade de vida
Sobre o mau uso de Ellen White
Por Davi Caldas
Um dos maiores entraves que muitas pessoas possuem
para entrar na Igreja Adventista é Ellen White. Conheço algumas que ainda não
se decidiram apenas por esse ponto. Já aceitaram sábado, mortalidade da alma,
reforma alimentar, juízo investigativo, etc. Mas não conseguem crer em Ellen
White.
Creio fortemente que isso se dá muito mais pelo mau
uso dela por grande parte dos adventistas do que propriamente pelo que ela diz.
Muitos adventistas cometem o erro de usá-la para resolver conflitos teológicos
e a enfatizá-la quase como se seus escritos fossem uma segunda Bíblia. Alguns
recorrem a Ellen White antes mesmo de irem à Bíblia, preferindo provar pontos
de vista por seus escritos.
Ora, isso é um erro grave que a própria Ellen White
condenava e que a doutrina adventista oficial também não endossa. As
consequências são nefastas. A Sola Scriptura é solapada com essa postura. A
Igreja perde credibilidade entre os protestantes. E a função de White é
totalmente distorcida. Além disso, os que mantém essa postura de colocar White
onde ela não deveria estar acabam por alimentar o grupo que está no extremo
oposto: os adventistas que desprezam e descartam totalmente os escritos dela.
Criamos um cenário de “ou 8 ou 80”. Isso não ajuda em nada a Igreja. Só
atrapalha.
Qual deveria ser a postura correta em relação a
esse assunto? Vou tentar explicar em poucas linhas. Começo com um silogismo:
1) A essência dos ensinos de Ellen White é
considerar a Bíblia como única regra de fé e prática, segundo a qual julgamos
todas as coisas, estuda-la profundamente e praticá-la fielmente;
2) Uma pessoa considera a Bíblia como única regra de fé e prática, segundo a qual julga todas as coisas, a estuda profundamente e a pratica fielmente;
3) Logo, essa pessoa está seguindo a essência dos ensinos de Ellen White.
2) Uma pessoa considera a Bíblia como única regra de fé e prática, segundo a qual julga todas as coisas, a estuda profundamente e a pratica fielmente;
3) Logo, essa pessoa está seguindo a essência dos ensinos de Ellen White.
Se esse silogismo estiver certo, isso significa que
uma pessoa não precisa, não deve e não pode usar Ellen White para resolver
debates teológicos, ir até ela antes da Bíblia e trata-la como uma segunda
Bíblia. Se o silogismo estiver certo, seguir Ellen White é ser essencialmente
bíblico: é buscar a resposta para todas as questões na Bíblia, julgar tudo pela
Bíblia (inclusive os escritos de Ellen White), ir sempre primeiro à Bíblia e
usar Ellen White tão somente para enfatizar e clarear o que já existe na
Bíblia. Em suma, seguir a essência de Ellen White é falar mais da Bíblia e
menos de Ellen White. Mas o silogismo está certo? Vejamos o que a própria Ellen
White diz a respeito:
“No trabalho público não torneis proeminente nem
citeis o que a Irmã White tem escrito, como autoridade para apoiar vossas
posições. Fazer isto não aumentara a fé nos testemunhos. Apresentai vossas
provas, claras e simples, da Palavra de Deus. Um “Assim diz o Senhor” e o mais
forte testemunho que podeis apresentar ao povo. Que ninguém seja instruído a
olhar para a Irma White, e, sim, ao poderoso Deus, que dá instruções a Irmã
White”. — Carta 11, 1894.
Ellen White entendia que seus escritos tinham o
propósito de conduzir à Bíblia, de enfatizá-la, de tocar em assuntos esquecidos
das Escrituras, de reforçar aquilo que o Senhor já havia dito, de estimular o
estudo da Palavra, de refletir sobre ela, de criar gosto por sua leitura, de
ser bíblico em todo o tempo. Assim, ela era apenas um canal para isso, um meio
para um fim, não um fim em si mesmo. Não faria sentido, portanto, tentar provar
posições por Ellen White. Até porque ela não queria ser crida só porque ela
falou. Mas desejava que suas próprias palavras fossem julgadas à luz da Bíblia.
Sobre isso ela diz em outra ocasião: “Se os [meus] Testemunhos não falarem de
acordo com a Palavra de Deus, rejeitai-os. Cristo e Belial não se unem”. —
Testimonies for the Church 5:691. Numa reunião de dirigentes da Igreja, ela
afirma em 1901:
“Como pode o Senhor abençoar os que manifestam o
espirito de ‘não me importa’, que os leva a andar em sentido oposto a luz que o
Senhor lhes deu? Não solicito, porém, que acateis minhas palavras. Ponde a irmã
White de lado. Não citeis outra vez as minhas palavras enquanto viverdes, até
que possais obedecer a Bíblia. Quando fizerdes da Bíblia vosso alimento, vossa
comida e vossa bebida, quando fizerdes de seus princípios os elementos de vosso
caráter, conhecereis melhor como receber conselho de Deus. Enalteço a preciosa
Palavra diante de vos neste dia. Não repitais o que eu declarei, afirmando: “A
irmã White disse isto” e “a irmã White disse aquilo”. Descobri o que o Senhor
Deus de Israel diz, e fazei então o que Ele ordena”. — Manuscrito 43, 1901. (De
uma alocução a dirigentes de igreja na noite que antecedeu a abertura da
Assembleia da Associação Geral de 1901.)
Parece bem claro a posição em que Ellen White se
colocava e a posição que ela colocava a Bíblia. Os adventistas deveriam ser,
acima de tudo, em primeiro lugar e em todo o tempo, bíblicos. A finalidade
máxima de Ellen White era tornar todos bíblicos. No momento em que nos
esquecemos disso, perdemos a essência dos Testemunhos de Ellen White. Sobre
isso, ela explica:
“Recomendo-vos, caro leitor, a Palavra de Deus como
regra de vossa fé e pratica. Por essa Palavra seremos julgados. Nela Deus
prometeu dar visões nos “últimos dias”; não para uma nova regra de fé, mas para
conforto do Seu povo e para corrigir os que se desviam da verdade bíblica.
Assim tratou Deus com Pedro, quando estava para envia-lo a pregar aos
gentios”.—A Sketch of the Christian Experience and Views of Ellen G. White, 64
(1851). Reimpresso em Primeiros Escritos, 78.
Note: Ellen White compara, em função, suas visões à
visão que Pedro teve em Atos 10 dos animais impuros no lençol. A visão de Pedro
não forneceu nenhuma verdade nova. Durante todo o Antigo Testamento, Deus
afirmou não fazer acepção de pessoas, comprovou isso na prática levando a
Palavra a diversos pagãos (Raabe, Rute, Naamã, Nabucodonosor, Dario, ninivitas,
etc.) e convidou os outros povos a adorá-lo (Is 56:1-8, Zc 8:20-23, etc.). O
sonho para Pedro serviu apenas para lembra-lo disso, impressioná-lo e fazê-lo
abrir as portas da Igreja para os gentios. A visão conduziu à Bíblia. Pois
Ellen White entendia que a função de suas visões e escritos era tão-somente
essa. Ela não pretendia e não queria se tornar uma “nova Bíblia”. Aliás, essa
foi uma acusação que ela mesma rebateu em sua época:
“O irmão J. procura confundir os espíritos,
esforçando-se por fazer parecer que a luz que Deus nos concedeu por meio dos
[meus] Testemunhos constitui um acréscimo a Palavra de Deus, mas com isto
apresenta os fatos sob uma luz falsa. Deus houve por bem chamar por este meio a
atenção de Seu povo para a Sua Palavra, a fim de conceder-lhes uma compreensão
mais perfeita da mesma.
A Palavra de Deus é suficiente para iluminar o
espirito mais obscurecido, e pode ser compreendida de todo o que sinceramente
deseja entende-la. Mas, não obstante isto, alguns que dizem fazer da Palavra de
Deus o objeto de seus estudos, são encontrados vivendo em oposição direta a
alguns de seus mais claros ensinos. Daí, para que tanto homens como mulheres
fiquem sem escusa, Deus dá testemunhos claros e decisivos, a fim de
reconduzi-los a Sua Palavra, que negligenciaram seguir.
A Palavra de Deus está repleta de princípios gerais
para a formação de hábitos corretos de vida, e os testemunhos, tanto gerais
como individuais, visam chamar a sua atenção particularmente para esses
princípios”. — Testimonies for the Church 5:663, 664; Testemunhos Selectos
2:279.
A função de Ellen White aqui é exatamente a mesma
dos profetas não canônicos do Antigo e do Novo Testamento como Natã (II Sm
12:1-16), Hulda (II Cr 34:18-28), Ágabo (At 11:27-30): conduzir à Bíblia,
repreender o afastamento das Escrituras, dar estímulo ao estudo da Palavra e
prever eventos importantes para a época. Nenhum desses profetas se tornou
canônico ou trouxe uma doutrina essencialmente nova. Todos os seus ensinos eram
baseados na Bíblia ou deduzidos diretamente dos princípios da Bíblia. O fato de
não serem canônicos não lhes tira a importância. Mas os coloca em seus devidos
lugares.
Uma grande preocupação de Ellen White era a
tendência de alguns, em sua época, de quererem substituir o estudo bíblico por
uma postura “pergunte para a Ellen”. Para alguns, se ela era divinamente
inspirada, então qualquer dúvida poderia ser dirimida a partir das palavras
dela. White condenou essa postura veementemente:
“O Senhor deseja que estudeis a Bíblia. Ele não deu
alguma luz adicional para tomar o lugar de Sua Palavra. Esta luz deve conduzir
as mentes confusas a Sua Palavra, a qual, se for comida e assimilada, e como o
sangue que da vida a alma. Então serão vistas boas obras como luz brilhando nas
trevas”.— Carta 130, 1901.
Outra vez, sobre a função dos seus Testemunhos
enfatiza:
“Nas Escrituras Deus expôs lições práticas para
governar a vida e a conduta de todos; mas, conquanto Ele tenha dado minuciosas
instruções a respeito de nosso caráter, conversação e conduta, em grande parte
Suas lições são negligenciadas e desprezadas. Além das instruções em Sua
Palavra, o Senhor tem concedido testemunhos especiais a Seu povo, não como uma
nova revelação, mas para que possa apresentar-nos as claras lições de Sua
Palavra, a fim de que sejam corrigidos os erros e indicado o caminho certo,
para que toda alma fique sem escusa”. —Carta 63, 1893. Ver Testimonies for the
Church 5:665.
E Ellen White fez isso muito bem. Através de seus
escritos, ela chamou a atenção dos líderes para um estudo mais cristocêntrico
da Palavra, para a divindade de Cristo, para a divindade do Espírito Santo,
para a importância da doutrina da justificação pela graça mediante a fé, para a
relevância da reforma da saúde, etc. Todas essas coisas podem ser achadas na
Bíblia? Sim. Então, para quê Ellen White? Porque quando as pessoas não estão,
por si próprias, investigando pontos importantes nas Escrituras (os quais Deus
quer enfatizar, relembrar e/ou resgatar), o Senhor usa profetas para expor
esses temas, enfatizar determinados pontos, estimular a pesquisa e, por fim,
levar de volta o povo à Bíblia.
Essa é a obra do profeta não canônico. Foi isso o
que Ellen White fez. E o modo de fazer isso foi bem simples. Ela escreveu sobre
temas bíblicos, enchendo suas páginas de referências nas Escrituras, a fim de
que fôssemos lá nas passagens. Assim ela despertou interesse em pesquisas,
reuniu textos bíblicos de cada tema e expôs temas sob ângulos que fizeram as
pessoas pensarem ou repensarem ideias e posturas, instigando-as a mergulharem
em pesquisas. Era isso o que ela almejava. “Irmão, leia isso aqui e vá para a
Bíblia. A Bíblia é a fonte. Só estou apontando”.
A respeito do Espírito Santo que ilumina a mente
dos profetas canônicos e também não canônicos, White pontua:
“O Espirito não foi dado—nem nunca o poderia ser —
a fim de sobrepor-Se a Escritura; pois esta explicitamente declara ser ela
mesma a norma pela qual todo ensino e experiência devem ser aferidos. … Isaias
declara: “A Lei e ao Testemunho! se eles nao falarem segundo esta palavra, não
haverá manhã para eles.” Isaias 8:20. — O Grande Conflito entre Cristo e
Satanás, 7.
Sobre a autoridade da Bíblia, ela explica e exorta:
“Examinem cuidadosamente as Escrituras para ver o
que é a verdade. A verdade não perde nada para a investigação minuciosa. Que a
Palavra de Deus fale por si mesma, que ela seja sua própria intérprete. […] Há
uma incrível indolência por grande parte de nossos ministros, que estão
dispostos a que outros ministros [presumivelmente Butler e Smith] pesquisem as
Escrituras para eles. Eles tomam as verdades de seus lábios como um fato
positivo, mas não conhecem a verdade bíblica através de sua própria pesquisa
individual e pela profunda convicção do Espírito de Deus em seus corações e
mentes. […] Muitos se perderão porque não estudaram a Bíblia de joelhos com
fervente oração. […] A Palavra de Deus é o grande detector do erro; cremos que
devemos recorrer a ela em todas as questões. A Bíblia deve ser nosso padrão de
toda doutrina e prática. […] Não devemos aceitar a opinião de ninguém sem antes
compará-la com as Escrituras. Eis a autoridade divina que é suprema em assunto
de fé” (EGW aos Irmãos, 5 de Agosto de 1888).
Alertando novamente sobre alguns ministros que
pareciam se colocar como autoridade suprema em alguns assuntos dentro da
congregação, White diz: “Meu apelo tem sido: Investiguem as Escrituras por
vocês mesmos. […] Nenhum ser humano deve servir de autoridade para nós” (EGW a
WMH, 9 de Dezembro de 1888).
Numa sábia exortação sobre os riscos de não se
manter um constante estudo das Escrituras, Ellen White afirma:
“Como um povo, corremos certamente grande risco, se
não estivermos em constante vigilância, de considerarmos nossas ideias, pelo
fato de serem longamente acalentadas, doutrinas bíblicas e infalíveis, e medir
todos pelo critério de nossa interpretação da verdade bíblica. Este é nosso
perigo, e este seria o maior mal que poderia sobrevir a nós como um povo” (Ms
37, 1890).
Entre 1886 e 1888, Ellen White negou
categoricamente diversos pedidos do presidente da Associação Geral para que ela
solucionasse um problema de interpretação bíblica através de um testemunho. E
creu ter sido providencial que um escrito seu sobre o tema em questão tivesse
se perdido. Ela expressou: “Deus tem propósito nisto. Ele quer que recorramos à
Bíblia e obtenhamos evidência escrituristica” (Ms 9, 1888; itálicos
acrescentados). Um ano antes, ela já havia escrito: “Queremos evidência bíblica
para todo ponto que defendemos” (EGW a GIB e US, 5 de Abril de 1887).
Sobre o julgamento das doutrinas e ideias
defendidas pela Igreja Adventista, ela afirma o seguinte em duas ocasiões:
“Se toda a ideia que temos defendido em matéria de
doutrina for verdade, não deve a verdade suportar a investigação? Ela balançará
e cairá se for criticada? Se for assim, que ela caia, quanto mais cedo melhor.
O espírito que fecha a porta para a investigação cristã dos pontos da verdade não
é o Espírito que vem do alto” (EGW a WMH, 9 de Dezembro de 1888).
“O fato de certas doutrinas terem sido mantidas
durante muitos anos por nosso povo não é prova de que nossas ideias sejam
infalíveis. O tempo não converte o erro em verdade […]. Nenhuma doutrina
autêntica é prejudicada pela pesquisa minuciosa” (CWE, p. 35).
“[…] tão-somente Deus e o Céu são infalíveis. Quem
acha que nunca terá de abandonar um ponto de vista acariciado, e nunca terá de
mudar de opinião, sofrerá decepção” (Ibdem, p. 37).
A respeito da autoridade transformadora da Bíblia,
ela diz que “a Bíblia, e a Bíblia somente, entesourada no coração e abençoada
pelo Espírito de Deus, pode tornar o ser humano reto e conservá-lo reto” (EGW a
GIB e esposa, 11 de Dezembro de 1888)”.
Com todos esses textos, fica claro qual era o
pensamento de Ellen White a respeito da posição da Bíblia e de sua própria
função. E, por conseguinte, fica claro que o silogismo proposto no início do
texto está correto. A essência dos escritos de Ellen White é seguirmos a Bíblia
Sagrada e a colocarmos em primeiro lugar. Quando fazemos isso, já estamos
seguindo Ellen White, sem nenhuma necessidade de colocá-la numa posição maior
do que ela está.
Isso quer dizer que Ellen White não tem valor? De
forma alguma. Conquanto White insista que devemos ir à Bíblia como regra, não a
ela, também orienta que não joguemos fora os seus testemunhos, mas antes, os
julguemos pela Bíblia e os aceitemos. Essa é a postura bíblica, aliás. Paulo
nos diz: “Não desprezeis as profecias; julgai todas as coisas, retende o que é
bom” (I Ts 5:20-21). Se o nosso compromisso é com a Bíblia (como era o caso de
Ellen White), então nossa obrigação é não desprezar o que bons cristãos dizem,
sobretudo se são profetas, mas julgar de acordo com a Bíblia. Se é bíblico,
aceitamos.
Assim, a postura não deve ser nem rejeitar Ellen
White por antecipação, nem aceitar cada um de seus ensinos apenas porque ela
falou. É sim considerar seus escritos com boa vontade, analisá-los pela Bíblia
(e seguindo as regras básicas de interpretação) e então dar um veredito. Não é
a Bíblia que deve ser julgada por Ellen White, mas Ellen White pela Bíblia.
Esse é o compromisso que ela lutou a vida inteira para que nós tivéssemos. E
essa é a doutrina oficial adventista. A crença 18 das 28 Crenças Fundamentais
diz que os escritos de Ellen White “tornam claro que a Bíblia é a norma pela
qual deve ser provado todo ensino e experiência. – Nm 12:6; 2Cr 20:20; Am 3:7;
Jl 2:28, 29; At 2:14-21; 2Tm 3:16, 17; Hb 1:1-3; Ap 12:17; 19:10; 22:8, 9”. Obviamente,
os próprios escritos dela não estão fora disso. E obviamente, se ela realmente
foi inspirada por Deus, a análise dos escritos dela provará que estão em
conformidade com a Bíblia. Como ela mesma disse, nada se perde quando provamos
nossas crenças pela Bíblia.
Equilíbrio é tudo. Se colocar White num pedestal é
ir contra a Bíblia, contra a doutrina oficial adventista e até contra ela
mesma, por outro lado, rejeitá-la também é mal e por duas razões: (1) se
realmente os conselhos de White são bíblicos e inspirados, quem não lhes dá
atenção pode vir a não despertar para verdades bíblicas que Deus deseja o
despertar; (2) há uma tendência de que ao desprezar White, a pessoa comece a
questionar a própria instituição adventista e, posteriormente, as doutrinas da
Igreja. Ainda que essas doutrinas não sejam baseadas em visões de Ellen White,
mas em estudos profundos da Bíblia, os cérebros costumam a fazer essa
associação. É como se um ponto questionado fizesse ruir todos os outros. Por
isso, White nos diz para ouvi-la. Não é para usá-la como Bíblia, mas para
perceber o que Deus talvez esteja querendo enfatizar e até resgatar em Sua
Palavra para a nossa vida. Seus escritos são um meio, não um fim.
Do ponto de vista prático, então, o que fazer? Em
primeiro lugar, parar de enfiar Ellen White nos debates teológicos. A não ser,
é claro, se o debate for especificamente sobre ela. Afora isso, devemos buscar
a Bíblia, provar pela Bíblia, argumentar pela Bíblia, respirar Bíblia.
Em segundo lugar, entender que Ellen White é uma
ferramenta, um meio, um canal, assim como devocionais, guias de estudo e livros
cristãos em geral. Devemos ler com o intuito de conhecermos mais da Bíblia, de
enxergarmos detalhes bíblicos que nunca percebemos, de fortalecer convicções
bíblicas. A finalidade é a Escritura. Tudo aponta para ela.
Em terceiro lugar, não devemos usar Ellen White
para criar medo e fazer acusações levianas. Perfeccionistas são expert nisso.
Devemos lembrar que (1) White escreveu para contextos específicos e (2) as
ideias do profeta são inspiradas, mas as palavras são suas. Ou seja, é fácil
pegar textos mais duros, escritos para contextos específicos e com palavras
fortes para metralhar irmãos. O resultado é a desvalorização da Bíblia, da
própria Ellen White e do conselho que se quer dar ao irmão. Por exemplo, na
Bíblia há esse texto: “Filha da Babilônia, que hás de ser destruída, feliz
aquele que te der o pago do mal que nos fizeste. Feliz aquele que pegar teus
filhos e esmagá-los contra a pedra” (Sl 137:8-9).
Pesado, não é? É um texto que exige um uso
responsável, uma análise bem contextualizada e o entendimento de que o autor
usa palavras fortes como um resultado de um desabafo, proveniente de uma dor
profunda. Um uso irresponsável do texto, no entanto, pode criar um evangelho
distorcido, com margem para violência e vingança. E pode ser usado para colocar
medo. Não é diferente com Ellen White.
Finalmente, como Ellen White mesmo diz, se queremos
convencer as pessoas de que nossas mensagens são bíblicas e verdadeiras,
incluindo aí cristãos de outras igrejas, precisamos usar a Bíblia e sermos
conhecidos por isso. Enquanto formos conhecidos como aqueles que usam Ellen
White, o preconceito será forte e, até certo ponto, justificável. Quando formos
conhecidos como o povo que usa a Bíblia, aí não só a Bíblia será valorizada,
mas a própria Ellen White, já que a essência de seus ensinos era exaltar a
Santa Palavra de Deus.
Reflitamos sobre isso e sejamos mais bíblicos.
Nossa doutrina é boa, correta e bíblica. Mas nossos membros têm cometido erros
grandes. E isso causa uma péssima impressão tanto para quem está de fora, como
para quem está entrando. E é um tiro no pé ter uma líder histórica que escreveu
tantas coisas boas que nos levam à Bíblia se tornando, por culpa de membros
ignorantes, uma pedra no sapato de quem quer congregar conosco e viver as
doutrinas bíblicas.
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